quarta-feira, junho 18, 2008

Estou farto de ignorantes e/ou hipócritas (riscar o que não lhes interessa)

Recebi numa das minhas caixas de correio e a despropósito do acordo ortográfico, a extraordinária mensagem que passo a transcrever:

«A Minha Pátria é a Língua Portuguesa
Petição contra acordo ortográfico!
De fato, este meu ato refere-se à não aceitação deste pato com vista a assassinar a Língua Portuguesa. Por isso ... por não aceitar este pato ... também não vou aceitar ir a esse almoço para comer um arroz de pato ... A esta ora está úmido lá fora ... por isso , de fato lá terei hoje de vestir um fato ..

Concorda com o modo de escrever acima exemplificado?
Se não concorda, clique na imagem que se segue e assina:


»
(fim de citação)


Ora bem... tenho meia dúzia de coisas a afirmar sobre este assunto:

1 - O acordo ortográfico vai eliminar as consoantes "mudas". Isso quer dizer que não vamos escrever as letras que não vocalizamos. Como em ato, ou úmido (não dizemos acto, nem lemos o agá de húmido).

2 - No entanto, as consoantes de pacto e de facto não são mudas - não o são, pelo menos, e que eu saiba, no português que se fala em Portugal. POR ISSO MESMO, EM PORTUGAL, VAMOS CONTINUAR A ESCREVER PACTO E FACTO - PORQUE É DESSA MANEIRA QUE FALAMOS! Tal como no Brasil ninguém vai deixar de escrever decepção - quando a letra P (pê) se vocaliza assim mesmo, no português que é falado no Brasil!

3 - Por outro lado, acho muita piada ao facto de o autor (ou autora) da mencionada mensagem de e-mail se armar em mandatário (ou mandatária) de Camões, Eça e Pessoa. Como se o português que eles falavam e escreviam fosse "o puro", "o autêntico", enfim: A Língua Portuguesa (com maiúsculas, que é mais solene). O português-padrao, intocável, portanto.
4 - Português-padrão, intocável? Mas... qual deles? O português de Camões (que escrevia "entre gente remota edificarão / novo reino, que tanto sublimarão" - referindo-se ao pretérito, e não ao futuro)?
O português de Pessoa (que escrevia "janella" com dois éles, e "á chuva", com o acento para o lado direito)? Ou o português do Eça? Ou o da physica e da pharmácia?

5 - Eu aceito que se possa ser contra o acordo ortográfico. Claro que sim! Certamente haverá razões para tal. Mas, então, expliquem que razões são essas. Não venham é com argumentos perfeitamente falaciosos.
6 - Concordem ou não comigo, não vale a pena clicarem na imagem seguinte, porque ela não vos leva a nenhum abaixo assinado. Nem mesmo a um que anda por aí a circular, pedindo uma mais rápida implementação do acordo. Eu não assinei - mas, francamente, com tantos "velhos do restelo" a argumentar com disparates tais como os supracitados... olhem que já tive vontade de o fazer!


PS (ou, se preferirem, digamos antes "mais uma coisita"): isto não é nenhuma crítica a quem me reenviou o "mail". Espero, no entanto, que quem o fez pense melhor da próxima vez, para não andar a espalhar por aí coisas disparatadas e desnecessárias. Já há muito anormal a fazer isso; logo, não precisamos nós - pessoas inteligentes e minimamente decentes - de o fazer também. Certo?

5 comentários:

Abrenúncio disse...

O que eu penso é que não existe necessidade alguma de qualquer acordo ortográfico. Uma coisa é o evoluir "natural" de uma lígua (De Camões para Pessoa e de Pessoa para Eça) que progrediu sem necessidade de recorrer a acordos, outra coisa é impor uma uniformização que não vejo de forma alguma como uma mais valia para a língua nem para a valorização da mesma.
Não é por os americanos escreverem de forma diferente o inglês e de vulgarmente "comerem" ou abreviarem certos termos que o inglês deixou de ser uma língua importante, a mais importante do mundo, comercialmente falando. É claro que nunca poderemos impingir ao português essa importância, pelo menos no aspecto comercial, mas a diversidade na escrita também não pode ser vista como um enfraquecimento ou perda de identidade linguística.
O que é certo é que este acordo, feito segundo a minha opinião, com o intuito de fazer valer aspectos económicos e comerciais que em tudo beneficiam o Brasil, não trazem vantagem alguma a Portugal.
Aliás, posso estar enganado, mas não conheço caso algum em que o país de "origem" de uma língua, tenha feito acordos ortográficos que visem alterar a sua própria forma de escrever,com os países que falam a mesma, estilo França/Argélia, Marrocos, Canadá, Suíça, etc, ou Espanha/ América Latina, etc.
Saudações do Marreta.

Debaixo do Bulcão disse...

Bem, Marreta... essa argumentação dá pano para mangas. Eu até concordo com parte do que dizes. Mas não vejo nenhuma razão para me opor ao acordo ortográfico.

Esclareço: não sou um adepto entusiasta do acordo (porque podiamos passar sem ele, todos nós, falantes da língua portuguesa), mas também não vejo aí nenhum "papão" que vem destruir, ou descaracterizar, ou desfigurar, a dita. E, entre vantagens e (supostas) desvantagens, penso que podemos até ganhar alguma coisa com a sua implementação. Penso, sobretudo, que não ficaremos a perder nada de importante.

Claro que - precisamente por haver muito "sumo" nos argumentos que apresentas - não vou agora, aqui, tentar fazer o "contraditório". Seria preciso mais tempo e mais espaço.

Tempo e "espaço" (e paciência...) que não estou para perder mais com os "apoiantes" de uma "causa" que nem sequer sabem muito bem qual é. É isso mesmo o que afirmo no meu "post"... aliás, artigo.

Saudações vitorínicas (e, já agora, bulcânicas)!

Debaixo do Bulcão disse...

Além do mais, gosto muito de futebol. E, à hora a que escrevo, falta pouco para o Portugal-Alemanha.

Estou noutra, portanto!

Vitorino

Luis Eme disse...

também recebi o e-mail, pensei mais ou o menos o mesmo que tu, Vitorino.

não é com meias verdades, misturadas com mentiras, que lá vão... os adeptos do não.

(se rima é verdade...)

Debaixo do Bulcão disse...

Luís: eu li o que escreveste algues sobre o acordo (julgo que foi num dos teus blogues) e concordei.

Agora discordo: porque nem tudo o que rima é verdade.

"Eram Poetas" não rima - e é verdade.

Aliás, é tão verdade que eu me sinto embaraçado para escrever alguma coisa acerca disso.

Andei a tentar escrever sobre a minha experiência "cultural alternativa" dos anos 90, em Almada, não consegui - e eis que vem um tipo das Caldas e faz o que eu estava a tentar, e fá-lo em "meia dúzia de versos"!


A sério: não sei o que faça com esse poema. Se não o vires publicado juntamente com os outros da próxima edição do Bulcão (nos blogues... porque na edição em papel já lá está), é porque estou a preparar uma "resposta" adequeda.

Que ele merece!

Grande poema!

Retribuo um comentário teu, de há meses atrás:

às vezes (agora, com esse poema) és (foste, naquele caso) brilhante!

Hum... isto era sobre o acordo ortográfico?

Mas eu (que gosto muito de futebol) estou muito tristonho
para falar dessas coisas.


A.V.