terça-feira, fevereiro 27, 2007

Pergunta infantil















será verdade que qualquer casinha de chocolate
esconde sempre uma bruxa má?

será que existem bruxas boas
que não se escondem dentro de casinhas de chocolate?




António Vitorino

(Publicado no Debaixo do Bulcão poezine
número 13, Março de 2000.
Imagem recolhida no site
www.witchhunter.net)

sexta-feira, fevereiro 23, 2007

A minha opinião sobre "os 20 anos da morte do Zeca"

Toda esta euforia comemorativa faz-me lembrar uma frase que, salvo erro, é do Almada Negreiros: Portugal, o país onde Camões morreu de fome e onde toda a gente enche a barriga de Camões! (Corrijam-me se estiver errado.)
Enquanto José Afonso foi vivo e bem vivo, era um baladeiro de intervenção, um gajo incómodo e, pior, um perigoso esquerdista (repararam que desta vez não escrevi "comunista", não repararam?...).
Agora, aqueles que ele incomodou, e que se incomodaram com ele, tecem-lhe os mais rasgados (e descarados) elogios.
Agora, que passaram 20 anos, comemora-se alegremente o aniversário da sua morte. (Também já devem ter reparado que em Portugal só se comemoram as mortes. Porque será?...).
Metem-no em cima de um pedestal e chamam-lhe, porreiristicamente, O ZECA!!!
Dá vontade de fazer como o outro personagem e perguntar: mas onde é que vocês estavam há 20 anos, quando "o Zeca" morreu?
Eu cá tenho um bom alibi, estou safo.
No dia 23 de Fevereiro de 1987 tinha acabado de chegar a um sítio ultra-secreto (embora tenha uma paragem de autocarros da Carris à porta) para fazer um "mini-curso intensivo de Marxismo-Leninismo", digamos assim para abreviar.
Estava, portanto, num grupo sujeito a regime de clausura temporária e voluntária. Quando soubémos, pela televisão, da morte do Zeca (pois, era assim que nós lhe chamávamos nessa altura...) ficámos todos muito consternados, como seria de esperar.
É que, afinal, nós (o grupo em que eu estava então incluído) fazíamos parte daquela minoria militante que cantava as canções dele como se fossem hinos para encorajar a resistência à sociedade neo-liberal que então começava a dar os primeiros passos e hoje está mais que consolidada (até ver).
Comemorar a morte do "Zeca"?
Tenham dó!









António Vitorino

quinta-feira, fevereiro 22, 2007

A "revolução" explicada aos pequeninos



a sociedade em que vivemos divide-se em 2 grupos:
os bons, que são os que não têm nada
e os maus, que são os que têm tudo.

os bons, porque são bons, querem distribuir
a riqueza dos maus por todos os bons.

mas os maus, porque são maus,
não deixam.

os bons, como são bons, começam por pedir com jeitinho
aos maus que distribuam a sua riqueza
pelos bons.

mas os maus, como são maus,
não querem.

então os bons, mesmo sendo bons,
são obrigados a matar todos os maus

e quando já não resta nenhum mau vivo para
impedir os bons de serem bons,
os bons, para provar que são mesmo bons,

distribuem a riqueza dos maus pelos bons.

e tudo o que não for distribuível
porque é mau
e, sendo mau, não serve aos bons,

é confiscado
e destruído
e arrasado.

assim se completa a revolução
e assim termina de vez a luta
dos bons contra os maus.

depois, com a revolução feita,
deixa de haver bons e maus:

ficamos todos comunistas.

primitivos

mas comunistas.



António Vitorino
(Fevereiro 2007)

(Comentário do autor, em sua legítima defesa: se é verdade que não se fazem omeletas sem partir os ovos, matar a galinha já não me parece lá muito boa ideia.)

sexta-feira, fevereiro 16, 2007

GOLIAS VALE MILHAÇOS CONTRA DAVID ALTO ÍNDIO



Foto cedida pelo blog
Bem Vindo a
(obrigado, Ana...)








quando o golias de vale de milhaços
escreveu numa parede do laranjeiro
GOLIAS VALE MILHAÇOS
o david do alto do índio não lhe quis ficar atrás
e para mostrar o muito que vale
escreveu na mesma parede do laranjeiro
mas em letras bem maiores
DAVID ALTO ÍNDIO.
todos os dias durante uma semana inteira
o david do alto do índio
passava por aquela parede do laranjeiro
só para confirmar que estava tudo em ordem.
o golias de vale de milhaços esse
andava já muito ocupado por outras freguesias
do concelho de almada mas também do concelho do seixal
a escrever
GOLIAS VALE MILHAÇOS.
e assim (mural da estória) nem david nem golias
(para grande frustração deste vasto povo almadense/seixalense)
começaram um duelo de dimensões bíblicas
naquela parede do laranjeiro.

mural alternativo, só para quem não sabe
o que é um duelo de dimensões bíblicas:
e assim nem david nem golias
(para grande frustração deste vasto povo almadense/seixalense)
começaram naquela parede do laranjeiro
uma gigantesca e sangrenta batalha
tipo fight intergaláctica, tás a ver?

António Vitorino






Querem saber mais?
Ora vejam...

Golias.net (juro!)

Blog do Davi e do Golias
(Quéquequerem, não tenho culpa que seja Carnaval...)

quarta-feira, fevereiro 14, 2007

Dia de São Valentino!



(Pronto, tá bem, é uma "piada intelectual".
Mas eu também tenho direito a fazer
"humor inteligente", não tenho?...)

terça-feira, fevereiro 13, 2007

(Esta é do Zeca Afonso. Lembram-se?)




Tenho um primo convexo



Tenho um primo convexo
Fadado para amnistias
Em torno de ele nadam
Plantas carnívoras
Agitando como plumas
As cordas violáceas
O meu primo dormita
Glu glu entre palmeiras
Suspenso numa rede
De suor e preguiça
Corvos bicam-lhe os pés
Trincam-lhe os calos
Enquanto a tarde jaz
E a mão suspende
O gesto de acordá-lo
E a terra treme
Mas de nada o meu primo se apercebe


José Afonso






No álbum Coro dos Tribunais


(É claro que eu só me lembrei disto depois de sentir o sismo de ontem...
O meu primo convexo, por seu lado, nem se apercebeu.)

segunda-feira, fevereiro 12, 2007

Alegoria do Golias

golias era alto mas david era baixote
(e aviso desde já não conheciam dom quixote)
quando golias passeava no seu jardim que era o mundo
david rastejava pávido metia-se na sua toca
e ensinava à família: olhem que ali vai golias
é preciso aprender a conjugar o verbo humilhar.
a mulher e os sete filhos de david não sabiam
mais que conjugar o verbo encolher na casca do misticismo.
golias grande próspero e feliz
amiúde perorava aos bons povos do seu mundo:
encolhei-vos humilhai-vos e orai por mim
que no reino dos gigantes quem manda são os gigantes
mas ai de nós a porta do paraíso é um buraco de agulha
por onde só passam os que nesta vida bem se sabem encolher.
foi então que veio ao mundo a lagarta que rói a alma
com ela vinha o bicho da dúvida e logo atacaram david.
isso foi há muito tempo
agora já ninguém se encolhe na casca do misticismo
e o neto de david está mesmo a planear uma escalada à cabeça do gigante
afinal não há mais alto miradouro
para esquadrinhar com olhos onde é o fim do mundo
e confirmar se a porta do paraíso é assim tão apertada.
é claro que o neto de david já não acredita nisso
e prepara uma secreta vingança:
esse medo que antes nos atrofiava, as palavras
tu nem sonhas golias, vais engoli-las
quando eu estiver mais alto do que tu.


António Vitorino


Referências:



El Ingenioso Hidalgo Don Quixote de La Mancha
(Versão integral, na Bibioteca Digital Cervantes)




Zoo Poesia

sexta-feira, fevereiro 09, 2007

Razões para votar SIM

(Este texto - cuja autora desconheço - já circula há algum tempo na net. De tudo o que li até agora, parece-me ser o que explica de forma mais objectiva e escorreita as razões para votar Sim no referendo de domingo. Aqui vai)

«Não faço parte de nenhum movimento partidário ou oficial nesta campanha, pelo SIM ou pelo NÃO, no referendo sobre a DESPENALIZAÇÃO da Interrupção Voluntária da Gravidez.
Depois de ver e ouvir muitas opiniões sobre este assunto, e depois de muito resmungar contra o ecrã de televisão, resolvi desabafar e partilhar a minha opinião sobre este referendo e peço-vos apenas 5 minutos de atenção para que ponderem um pouquinho, antes do dia 11 de Fevereiro, sobre o que vos apresento aqui.

Ninguém nos está a perguntar, no referendo, se somos a favor ou contra o aborto!

Ninguém nos está a perguntar, no referendo, se algum dia vamos ou não fazer (ou apoiar) um aborto!

Este referendo pergunta, apenas se achamos que as mulheres portuguesas devem continuar a ser criminalmente acusadas (e até presas) e PENALIZADAS por fazerem um aborto.

Este referendo pergunta, se concordamos com a alteração de uma lei, que não é mais do que um sol tapado com uma peneira.

Em Portugal fazem-se abortos! (e muitos)

E vão continuar a fazer-se mesmo que a lei não seja alterada.


A questão é:

Hoje uma mulher decide fazer um aborto e (actualmente) faz no mesmo dia.

Com a despenalização uma mulher decide fazer um aborto e antes de o praticar, vai ser acompanhada e informada sobre outras opções e provavelmente algumas até desistem.

E mesmo que mantenha a mesma decisão, será melhor informada para que a situação não se repita.

Para mim não é claro, que com a despenalização, o nº de abortos vá aumentar, pelo contrário penso que vão diminuir.

Para nenhuma mulher é fácil decidir pelo aborto, e se, se sentir apoiada provavelmente muda de opinião.

E se o NÃO defende a vida, porque não defende a vida destas mulheres?

(já ouvi o nº de 5000 mulheres que morrem, por ano, vitimas de abortos mal feitos).

Para mim os criminosos não são as mulheres que se sentem num beco sem saída, com uma gravidez indesejada e decidem fazer um aborto.

Mas sim os verdadeiros criminosos, são aqueles que ganham fortunas a praticar abortos mal feitos e sem condições, pondo em risco a vida destas mulheres e deixando (em alguns casos) outras crianças órfãs.

Criminosos, somos todos nós que ao taparmos o sol com a peneira, permitimos que isto aconteça todos os dias.

Não está em causa no referendo a questão moral do aborto. Como dizia noutro dia um juiz, também é moralmente condenável o incesto e não é crime.

Para si pode ser moralmente condenável o aborto, e nunca o praticar…, mas a questão é se as mulheres devem ser presas e condenadas por fazê-lo, até porque estamos apenas a condenar mulheres de classes sócio/culturais baixas, porque as outras vão a Espanha.


Está em causa APENAS o enquadramento criminal desta questão.

Não PENALIZAR quem faz um aborto!


NINGUEM VAI OBRIGAR NINGUEM A FAZER UM ABORTO!

Pelo contrário, os abortos não se vão fazer por dinheiro e portanto os profissionais de saúde vão tentar dissuadir estas mulheres, em alguns casos.

Na minha opinião, este assunto não seria uma temática para referendo, não é um tema social mas sim criminal.

Não é uma questão de comunidade, mas sim uma questão pessoal e uma decisão de cada um!

Como alguém muito conhecido disse:”Não atires a primeira pedra!”

Eu provavelmente nunca farei um aborto, mas quem sou eu para condenar, para julgar ou compreender as histórias de mulheres desesperadas.

E agora tocando um bocadinho na demagogia das campanhas pelo NÃO, com a falta de argumentos credíveis, vem com imagem obscenas e estudos manipulados para que se consigam fazer ouvir. Ainda ontem alguém pelo NÃO dizia que nos países que o aborto é despenalizado o nº de abortos aumentou, mas que não sabiam qual era o nº de abortos praticados antes da despenalização. Por favor….


Pelo SIM à vida,

pelo SIM aos direitos humanos,

pelo SIM à saúde pública,

pelo SIM aos direitos individuais da mulher…….

Deverá ser o SIM, à despenalização voluntária da gravidez até as 10 semanas, a resposta a este referendo.»


(Texto reproduzido do blog
http://allmyindependentwomen.blogspot.com/)

quarta-feira, fevereiro 07, 2007

O argumento que ninguém tinha ousado (ainda) usar

Como este blog é supostamente sobre literatura, vou aqui citar (de memória, mas com bastante certeza) o que disse esta tarde na SIC Notícias a escritora Alice Vieira.
E o que ela disse foi isto:

«Às dez semanas bate um coração, é verdade. Tal como bate um coração nas pessoas que estão em estado terminal, ligadas a uma máquina».

Eu assino por baixo.
E aplaudo a coragem que Alice Vieira teve para revelar um facto que, embora seja irrefutável (em termos objectivos, científicos), ainda não tinha sido utilizado no debate em curso. E não o terá sido, penso eu, para não chocar.
No entanto, é verdade que às 10 semanas de gestação, o feto não tem o sistema nervoso central (e , por consequência, o cérebro) formado.
E quais são os critérios da ciência para avaliar se uma pessoa está viva ou morta?
Exactamente: ter actividade cerebral mensurável.
(Ver a este respeito o parecer 10/CNCV/95 do Conselho Nacional de Ética Para as Ciências da Vida, que defende: "o critério de morte definido pela irreversibilidade das funções do tronco cerebral deve ser o adoptado". Parecer que, de resto, vem de uma entidade que, em Janeiro 1997 se pronunciou contra a despenalização do aborto. Insuspeita, portanto... - embora eu não entenda muito bem o que me dá ideia de ser uma dualidade de critérios. Mas leiam também esse parecer...)
Claro que muita gente terá outras razões, morais ou religiosas, para refutar este critério de avaliação do que é afinal a vida humana.
Mas a esses será bom lembrar que o que está em causa neste referendo é de ordem jurídica: despenalização, não liberalização.
Despenalizar significa dar liberdade de escolha.
Ou seja: liberdade para decidir em consciência.
E decidir em consciência significa decidir de acordo com as convicções morais, políticas, religiosas ou outras. Sejam elas "a favor" ou "contra" a pergunta que vai ser referendada.
E a pergunta é:
«Concorda com a despenalização da Interrupção Voluntária da Gravidez, se realizada, por opção da mulher nas primeiras 10 semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?»
"Só" isso.

António Vitorino

(Para esclarecer dúvidas, vejam também esta página:
30 perguntas, 30 respostas, em
www.pcp.pt/actpol/temas/ivg/30perg.html
)

terça-feira, fevereiro 06, 2007

Um poema que não é meu (e um link para outro que também o não é)

tGvIvG

Houvera já TGV e mais rápido seria
ir ao lado, à IVG.
Não, não não, ao lado não,
baralhas a discussão,
dirão.
Esqueçamos a locomotiva,
fique legal e pague IVA.
Qual a sua posição,
neutral, activa, passiva,
acha que sim, ou que não?

Permanece uma questão:
Os hermanos chamam-lhe o quê?
Ao TGV e à IVG?

Noémia Calafate, in «Nas rosas com os tachos», 2006

(Poema retirado do blog Livralheiros)

O outro está no blog Canto Poético:
avano2006.blogspot.com/2007/02/triste-ironia-mulher-que-sofres-na.html

(As ligações para estes blogs encontram-se também em Debaixo do Bulcão)

sábado, fevereiro 03, 2007

A minha opinião sobre "a lei do aborto"

O Artur Vaz, escritor da SCALA que tenho o gosto de conhecer há uma dúzia de anos (por termos escrito para o mesmo jornal), convidou-me a compor uma homenagem em verso à poetisa Natália Correia. Um texto que, se eu o conseguir escrever, será incluído numa colectânea a publicar ainda este ano (irei dando novidades sonbre o assunto).
Ora, isto é um desafio e peras (gosto desta expressão...), que me está a dar água pela barba (...e desta ainda gosto mais)!
Porque, confesso, eu não sou propriamente um homem muito "letrado". Tenho uns poucos autores de referência, cuja obra conheço apenas razoavelmente: Gil Vicente (olha, começa bem a lista, com uma rima despropositada...), Camões, Bocage, Eça de Queiroz, José Gomes Ferreira, Armindo Rodrigues, Fernando Namora, Alexandre O'Neill, José Saramago; e, para não parecer que só gosto de autores portugueses, deixa-me lá acrescentar o bom do Cervantes e o engraçadinho do Shakespeare.
Quanto a Natália Correia... Bom, admito que conheço poucos (mas bons) poemas. Conheço (quem não conhece?) a "Queixa das Almas Jovens, Censuradas" (na versão musicada e cantada por José Mário Branco), e que mais?...
Ah, pois, é verdade! Aquele famoso episódio que a poetisa, e então também deputada, protagonizou na Assembleia da República.
Se desconhecem esse, digamos, incidente parlamentar, procurem, por exemplo, neste blog: allmyindependentwomen.blogspot.com (que eu escolhi perfeitamente ao acaso).
Este episódio está agora a ser recordado, muito por causa da campanha eleitoral para o referendo sobre a alteração da "lei do aborto" que vigora (ainda...) em Portugal. Eu apenas aproveitei a onda...
E a minha opinião sobre o assunto? Olhem , é igual à opinião da autora do mesmo blog (que, repito, não conheço de lado nenhum e encontrei na net quando pesquisava coisas sobre Natália Correia).
Leiam-na!


António Vitorino