Porque está a decorrer até sábado a Feira Internacional do Fanzine de Almada - no Ponto de Encontro (Cacilhas) - pareceu-me boa ideia evocar aqui uma das primeiras mostras de "publicações alternativas" (não sei se não terá sido mesmo a primeira...) que se fizeram nesta cidade.
Foi assim: durante a década de 80 (do século passado, como se diz agora) existia uma associação cujo nome era Centro Cultural de Almada (e à qual tive a honra, digamos assim, de pertencer entre 1981 e 1987). O CCA tinha actividades pouco visíveis: era essencialmente um sítio onde os agentes culturais do concelho iam receber formação técnica e artística que lhes dava competência para melhor desempenharem as suas tarefas.
No entanto, de ano a ano, o CCA lá aparecia em público como co-organizador (com a Câmara Municipal) da - anual - Feira do Livro de Almada. Sei que foram realizadas no Jardim da Cova da Piedade, na antiga Oficina da Cultura... Mas dessas não me lembro: ainda não estava no CCA.
Lembro-me, sim, porque nela participei, de uma que se fez na praça São João Baptista - muito atribulada, devido à grande ventania que ali se fazia sentir (e que a gente sentiu, de que maneira!...).
Ora bem: depois de dar uma ajudinha à realização de alguns desses (e outros) eventos, e já com alguma experiência (e já eleito para a direcção do CCA, ah ah ah!...) resolvi, em 1987, apresentar uma proposta para que se fizesse, na edição desse ano, uma mostra de edições de novos/jovens (não, aqui não é para riscar o que não interessa) autores. E importa referir que, nesse tempo, existiam muitos fanzines de poesia e literatura em geral (que conheci através do DN-Jovem, suplemento do Diário de Notícias - suplemento entretanto extinto - que estava a fazer um trabalho excepcional de divulgação de novos/jovens autores - embora com critérios de selecção que, às vezes, eram um bocadinho "incompreensíveis"); e existia também o Contraste, que era uma "autêntica pedrada no charco" (desculpem lá a piroseira, mas não me lembrei de expressão mais adequada).
A proposta foi aceite e a coisa realizou-se mesmo. Só que, como foi há tanto tempo, e como eu "perdi" os meus arquivos anteriores a 1998 (por razões que, como se costuma dizer "me ultrapassam" e que são demasiadamente complexas para explicar neste blogue - embora eu já o tenha tentado fazer...), já não me lembrava que, afinal, não se concretizou na Feira do Livro desse ano, mas sim numa "Semana do Livro" (nem sei se chegou a haver feira em 87, porque saí do CCA logo a seguir a essa "semana").
Ora, eu andava realmente meio esquecido destas coisas. Até que, há poucos dias, um feliz acaso (digamos assim...) me fez ter acesso a alguma documentação publicada pelo CCA. E isso refrescou-me a memória, sim senhor! (Bem, para dizer a verdade, a documentação de que agora disponho é tanta e tão interessante que estou como um miúdo numa loja de guloseimas... Mas adiante.)
Portanto, na Semana do Livro de Almada, em 1987, havia um espaço de exposição, distribuição e venda de trabalhos de autores novos, e jovens. Como complemento, fizeram-se recitais de poesia, uma "performance" poético-musical (julgo que se podia enfiar-lhe esse rótulo) e um debate sobre "edição e divulgação de jovens autores", com a participação de putos que tinham a mania que sabiam escrever (eu era um deles), de outros que por acaso até já sabiam, de outros, também, que publicavam os seus trabalhos em fanzines e outras edições "alternativas" (eu ainda não era um deles) e abrilhantado com a presença do director do DN-Jovem, Manuel Dias.Foi muito interessante. Não sei é se serviu para alguma coisa.
E pronto, era isto o que eu tinha para vos dizer acerca desse esboço de "feira do fanzine".
Querem mais informação sobre o evento que enquadrou e englobou essa mostra proto-fanzineira? Está bem. Pois tomem nota:
A Semana do Livro de 1987 decorreu entre 24 de Janeiro e 1 de Fevereiro desse ano, na Oficina da Cultura (a antiga, aquela que a partir de 1988 passou a ser o Teatro Municipal). Organizada pelo Centro Cultural e pela Câmara Municipal de Almada, teve, além de livros, um variado programa de actividades, nas quais participaram figuras maiores da cultura portuguesa, como António Victorino de Almeida, Joaquim Benite, Maria Aliete Galhoz, Luzia Maria Martins, entre outros. Do programa constavam: uma evocação de Aquilino Ribeiro (com projecção de documentário alusivo e um debate com a presença do filho do escritor, Aquilino Ribeiro Machado); uma homenagem ao conceituado professor universitário Manuel Viegas Guerreiro; um debate sobre jornalismo de investigação (a propósito do lançamento de um livro do jornalista especializado em questões do "Médio Oriente", José Goulão); colóquios sobre Federico Garcia Lorca e sobre Cesário Verde; espaços de divulgação de trabalhos de escritores vinculados ao concelho de Almada...
Bem, e tanta coisa mais que, se vos fosse contar tudo o que de interessante aconteceu durante essa semana, nunca mais saía daqui.
Portanto, saio agora e vou à minha vida. Fiquem bem (e apareçam na Feira do Fanzine!)
2 comentários:
o Centro Cultural de Almada é uma caixinha de surpresas, Vitorino...
Como se dizia nos anos 80: Yá meu, podes crer!
AV
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