segunda-feira, dezembro 10, 2007

“Cartas ao director” (entre aspas, porque é uma piada)


Como já vos expliquei (aqui), o Jornal da Região (JR, para abreviar) era muito compartimentado. E uma das secções que não podia faltar, nunca, era o “Diálogo com o Leitor”. Ou seja: o espaço que o jornal tinha reservado para publicar as cartas dos seus leitores.

Até aqui, tudo bem.
A chatice é que, quase sempre, não chegavam nenhumas cartas de leitores à redacção do jornal (que, como também já vos disse, era a mesma redacção do Sem Mais Jornal, em Setúbal).
Mas o espaço tinha de ser preenchido. Sempre. Em cada uma das edições.
Portanto... se não havia... olha, inventava-se!
Esta carta, que hoje, reproduzo, é inventada: foi escrita por mim, António Vitorino.
Para dizer a verdade, a situação nela descrita é (ou era) bem real. Mas acontece que ninguém se queixou. Foi um “desenrascanço” de última hora.
Eu conto-vos a história.
Numa certa noite desses tempos de boémia almadense (escrever isto faz-me sentir velhote, mas paciência...) fui a casa dos meus amigos João Gomes e Mónica Cristina beber uns grandes copos e, eventualmente, fumar alguma substância proibida, derivada de uma planta chamada Cannabis (pois, nesse tempo eu ainda fazia essas coisas). Essa casa ficava na tal rua João Schwalbach, referenciada no texto.
Eu - que até me assustei com o nome da rua: fez-me lembrar um vómito prematuro – nem reparei no tal “enorme buraco”. Por isso mesmo, quando (num dos atribulados fechos de edição do JR) comecei a telefonar aos meus amigos, para ver se algum se lembrava de alguma situação que pudesse dar um “Diálogo com o Leitor”, fiquei algo surpreendido quando o João Gomes me indicou essa questão.
Mas foi a minha safa. Portanto, disse obrigadinho - porreiro, pá! – e lá me desenrasquei a escrever a “carta do leitor”.
Isto é, pois, uma de várias “cartas” inventadas, que o JR publicou, durante esse ano de 1998. Eu cá até preferia não ter inventado nada. Um jornalista não é jornalista para andar a inventar coisas. Mas (repito) a paginação daquele jornal era tão rígida que a isso nos obrigava.
E, se acharam que esta história até nem é muito interessante... eu concordo convosco: não é. Tenho outras bem mais interessantes.
Mas esta é, para mim, e para quem me conheceu nesse tempo, também uma piada privada. Que (por ser privada) não vou explicar melhor.
Ficamos assim.

3 comentários:

Debaixo do Bulcão disse...

Ora bem, já que ninguém comenta esta pseudo-carta, vou eu comentar.

E comento com duas perguntas: acham isto demasiado estranho para ser verdade? ou este tipo de aldrabice já se tornou tão “normal” que nem merece comentários?
Se for o segundo caso, tenham lá cuidado com a aceitação dessas “normalidades”, ó meus amigos. Lembrem-se do que dizia “o Zeca”: «quando começamos a procurar justificações para a nossa acomodação, aí sim, está tudo lixado» (citei de memória, mas não ando muito longe do que ele disse de facto…).

Mas se pensam que eu estou a inventar…

Bem, deixem-me então dizer-vos que passei hoje um bocado da tarde no Arquivo Histórico de Almada, a consultar edições de 1998 do Jornal da Região. E fartei-me de rir, ao reler mais algumas “cartas de leitores” (que, como certamente entendem, foram “fabricadas” por mim – embora, sempre, a partir de factos e acontecimento reais…).

Aqui ficam alguns exemplos (apenas os textos de introdução às “missivas”, para não ser muito massudo):

«Fernando Silva, morador no Laranjeiro, queixa-se do trânsito intenso na Estrada Nacional 10 e pergunta para quando as prometidas alternativas ferroviárias»

(JR Almada, nº 23, 25 Março 98)

«Ana Monteiro escreve-nos a alertar para as más condições do estádio do Clube Desportivo da Cova da Piedade»

(nº 26, 15 Abril 98)

«O nosso leitor Rui Rocha, morador em Cacilhas, alerta para o perigo iminente provocado por um prédio em ruínas, numa rua muito frequentada daquela freguesia»

(nº27, 22 Abril 98)

«Carmelinda Martins, residente no Feijó, dá conta do seu descontentamento pela falta de espaços verdes naquela freguesia»

(nº38, 8 Julho 98)

«Do nosso leitor João Anacleto, da Cova da Piedade, recbemos uma queixa a propósito do intenso tráfego que circula na Av. António José Gomes, sobretudo ao nível das carreiras urbanas»

(nº42, 5 Agosto 98)

«O nosso leitor Álvaro Carvalho, do Monte de Caparica, manifesta as suas apreensões quanto ao futuro dos transportes públicos naquela freguesia»

(nº44, 2 Setembro 98)

«O nosso leitor Fernando Lopes queixa-se das dificuldades de utilização das cabines telefónicas em Cacilhas»

(nº 45, 9 Setembro 98)

«O nosso leitor Vitorino Abreu, morador na Cova da Piedade, vem alertar sobre o lixo que se acumula na Av. António José Gomes»

(nº 54, 11 Novembro 98)

«Da nossa leitora Maria Feliciana Ramos, recebemos a seguinte carta, a reclamar das paragens de autocarros da TST»

(nº59, 16 Dezembro 98)

Assim, partindo de factos, criava-se uma ilusão de informação e um arremedo de “serviço público”, que supostamente servia para dar voz a “cidadãos indignados”, mas que não passava de uma encenação, feita apenas por quem (sem dar a cara) escrevia (aldrabava).

Não sei muito bem porquê, mas isto – que é de 1998, note-se - faz-me lembrar alguns blogues de agora, de 2007. Coisa estranha!...
Porque será?

António Vitorino

Luis Eme disse...

O que falas não é jornalismo.

Embora se pratique em muitos lugares, bem afamados...

Essa Almada de que falas, de 1998, é muito diferente da de hoje, quase dez anos depois.

Os políticos são quase todos os mesmos, mas também procedem de forma diferente.

Hoje não é preciso inventar muito para "dar porrada" na Câmara e na CDU, tal tem sido o corrupio de asneiras praticadas, ao ponto de envergonharem vários comunistas almadenses.

A maior de todas, é o "casamento" aparentemente feliz com o capitalismo, tão perseguido pela casa-mãe da Soeiro Pereira Gomes...

(à parte desdes ismos, onde posso arranjar um ou dois "Debaixo do Bulcão"?)

Debaixo do Bulcão disse...

Luís:

como deves calcular, não vou agora fazer comentários à tua opinião sobre a CMA e sobre os "ismos". Dava pano para mangas.

"Almada está muito diferente"? Não sei.Talvez. (Sinceramentre, parece-me que, desde o final da década de 90, não aconteceu nada de muito significativo em Almada - e nada de bom, no país). Há agora o MST... isso sim, é novo (e, a meu ver, há-de ser bom).
Isso também dá pano para mangas...

Portanto, Almada até pode estar diferente, os políticos podem ter outras formas de acção, e mesmo o Jornal da Região pode já não ser o que era... (há tradições que mais vale não preservar).

Mas a manipulação de factos e a demagogia disfarçada de informação continuam na mesma. Já não tanto no Jornal da Região mas, sem dúvida, em alguns blogues.

O Bulcão começa a ser distribuído ainda esta semana (espero eu), só ainda não sei bem onde e quando. Mas para ti (como para todos os autores) vou reservar pelo menos meia dúzia de exemplares.

Assim que tiver certezas, envio-te um mail para combinarmos isso.

Saudações (democráticas, claro!...)

Vitorino