Passo os olhos pela revista do semanário Expresso de 21 de Setembro de 1996, e leio:
«Ourém, 24 de Agosto: um casal e dois filhos são mortos a tiro de caçadeira; Águas de Moura, 3 de Setembro: uma bomba explode no carro do casal Galego; Fundão, 6 de Setembro: uma bomba deflagra na escola e mata uma funcionária».
E mais: «O assassínio de toda a família de Acácio P., na madrugada de sábado, 24 de Agosto passado, em Ourém, Quinta da Granja, revestiu-se de uma tal crueza que um investigador da PJ não hesitou em abandonar a habitual circunspecção policial para declarar que os crimes «foram cometidos num quadro de grande dramatismo e demonstrando grande vileza».
(texto do jornalista Rui Pereira, na mencionada publicação)
O artigo citado (Três crimes da 'loucura normal') dramatiza - excessivamente, para o meu gosto, mas enfim... - crimes vionetos ocorridos nesse Verão de 1996... com recurso a caçadeiras, e (surpresa?) bombas (uma num carro, outra à porta de uma escola!), todos eles (convém esclarecer) cometidos por cidadãos portugueses!
Mas três crimes, por muito violentos que sejam, não nos dão o direito de dizer que estamos (estivemos) perante uma "vaga de criminalidade violenta". O sentimento de insegurança nem sempre corresponde a um aumento real dessa criminalidade.
A propósito (ainda segundo a revista do Expresso) o ano de 1994 (doias anos antes, portanto) foi muito mauzinho nesse aspecto da criminalidade violenta - as pessoas é que já não se lembravam.
Passo a citar:
Passo a citar:
"A sangue frio" - crimes do Verão de 1996, segundo a revista do Expresso
Motivos insondáveis e violência desproporcionada são comuns à maior parte dos crimes cuja coincidência no tempo põe em causa a segurança em geral
Um pai, que há muito se mostrava desavindo com o filho, matou-o por ter tropeçado nos seus pés, quando se encontrava num café. Um marido matou a mulher tetraplégica, com gás asfixiante, para se livrar dela. Um irmão e uma irmã, septuagenários, viviam sós e o primeiro considerou que o melhor para ambos era pôr fim à vida - matou a irmã e pretendia de seguida suicidar-se, tendo mesmo convocado a imprensa para um hotel, com objectivo de se explicar. Os três casos passaram-se em 1994 e tiveram lugar de destaque nas páginas de jornais e nas televisões. Grosso modo, analisadas as motivações e as circunstâncias, encontrar-se-ão mais afinidades que diferenças, em relação à recente onda de homicídios (54, entre os dias 1 de Julho e 9 de Setembro) - de 1996.
Talvez a primeira e principal diferença seja a de os crimes de 1994 estarem já esquecidos. Pelo contrário, a memória colectiva ainda está impressionada e tem bem presentes o assassínio de uma família inteira, a morte de um casal à bomba, ou a do jovem de 17 anos que se recusou a entregar 20 contos(...). Os motivos são fúteis e a violência é desproporcionada, nalguns casos refinada mesmo, com apreciável grau de planeamento e concepção. Impressionante é também a coincidência temporal. Mas sabe-se que tal não é inédito: o mês de Janeiro deste ano (1996) registou o mesmo número de crimes (24) que Agosto. Vinte e quatro foram também os homicídios verificados em Maio, Novembro e Dezembro de 1995. E em Março de 1994 o número foi ainda mais elevado: trinta e cinco casos consumados.
(Texto de Ana Paula Azevedo, revista do Expresso, 21 de Setembro de 1996)
Em que ficamos, então?
Que tal espreitarmos o que se dizia (escrevia) sobre a criminalidade em Portugal, e o sentimento de insegurança, nesse ano de 1994?
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