terça-feira, agosto 04, 2009

Almada, Verão de 1384 - II: O cerco castelhano e a resistência almadense


Na luta pela independência nacional, durante a revolução de 1383-85, Almada esteve cercada pelo exército castelhano, entre Maio e Agosto de 1384. Resistiu enquanto foi possível - com muito sofrimento, privações e actos de heroísmo.

O investigador Alexandre Flores escreve, a partir da Crónica de D. João I, de Fernão Lopes):
"Na vila de Almada prosseguiam com alguma regularidade as escaramuças. O rei de Castela ordenou algumas das suas forças que fizessem uma cava longe do arrabalde em direcção a uma torre, junto à porta do castelo. No entanto, foram sair com a boca da cava à alcárcova, tendo sido imediatamente repelidos pelos almadenses.


Como esta operação não surtira qualquer efeito militar, o rei de Castela resolveu dirigir pessoalmente o combate, tendo para o efeito, mandado construir sobre o campanário da Igreja de Sant'Iago um cadafais forte de madeira. Aquando de uma luta entre os besteiros de ambas partes, os almadenses, sitiados no castelo, pensando que o rei castelhano se encontrava no referido cadafais, fizeram u tiro com um trom, resultando dois mortos e três feridos nos castelhanos, pouco tempo depois de o rei se ter retirado para comer.

Os castelhanos voltaram à carga, lançando duas fortes bombardas, mas o forte de Almada não sofreu qualquer estrago.

Os moradores de Almada começaram a ter dificuldades, sobretudo com a falta de água que ia rareando. A água existente na única cisterna do Castelo, acabou por se esgotar.
Como a água tinha minguado e os almadenses sitiados procurassem por todos os meios não se renderem, efectuaram, então, duas tentativas para obter água, descendo a barroca atrvés de um caminho que fizeram até junto ao rio Tejo. Na primeira tentativa, conseguiram iludir a vigilância inimiga, mas à segunda vez, cerca de cem castelhanos que se encontravam escondidos entre os penedos, atacaram de surpresa os 17 almadenses que transportavam diversas tinas. Desta escaramuça, os portugueses sofreram três mortes e os restantes feridos de setas e de dardos, ainda conseguiram levar para o castelo dois odres meos dagua".

Este episódio é, de resto, contado por Camões - com evidente exagero nos números - no Canto VIII de Os Lusíadas:

Olha que dezessete Lusitanos,
Neste outeiro subidos, se defendem,
Fortes, de quatrocentos castelhanos,
Que em derredor, pelos tomar, se estendem;
Porém logo sentiram, com seus danos,
Que não só se defendem, mas ofendem.
Digno feito de ser, no mundo eterno,
Grande no tempo antigo e no moderno!


"Em Lisboa, o Mestre de Aviz, conhecedor da situação aflitiva que se vivia no Castelo de Almada, decidiu enviar pela noite em socorro dos almadenses sitiados, uma barca com um trom, pólvora, bestas e outras armas. Por engano, a barca acabou por aportar junto aos batéis de Castela, tendo resultado a prisão dos tripulantes e a confiscação daquele material de guerra."

Acontece, então, um dos episódios mais curiosos e bizarros de todo o cerco: o regedor da vila, Affonso Gallo, é levado, como prisioneiro, em frente às muralhas do castelo. Diziam os castelhanos que, se Almada não se rendessem, o seu regedor seria morto ali mesmo. Estava Affonso Gallo acorrentado, lado a lado com um cavaleiro do exército castelhano, note-se!
Sabem o que aconteceu? Os almadenses responderam que bem os podia elRei (de Castela) matar se quisesse, mas que a villa nom dariam por nada que fosse. Dito e feito: dispararam, de entre as ameias do castelo, um projéctil. E, espantosamente, atingiram o castelhano, sem ferir o regedor da vila!

Fezerom prestes huu trom pequeno e tiraromlhe dantes as ameas: e foi tal sua ventuira que deu com elle (o castelhano) morto em terra e ficou Affonso Gallo vivo em pee (Fernão Lopes)


Então? Dava um filme ou não?

(continua)

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