quinta-feira, agosto 28, 2008

A "Festa da Amizade" - Almada, Agosto de 1988

Almada também teve uma "mini-festa-do-avante". Chamava-se Festa da Amizade, era organizada pelo PCP concelhio (e pela JCP, já agora...), e realizou-se entre 1977 e o final dos anos 80 - primeiro, num terreno vago entre dois edifícios, nas Barrocas (para quem conhece Almada, digo-vos que era do lado direito de quem sobe a rua da SFUAP...), mais tarde em terreno bem mais amplo, no Laranjeiro (se não me engano, sensivelmente onde está hoje uma escola secundária...) e por fim, ou pelo meio (não me recordo bem da data), num recanto do local onde hoje está a Biblioteca Municipal de Almada - Fórum Municipal Romeu Correia.

Eu fui um dos (muitos) que participaram em algumas dessas festas. Na de 1988, por exemplo: festa que, em pleno Agosto, meteu água, não em sentido figurado mas em sentido muitíssimo literal. Aqui ficam alguns excertos da reportagem de duas páginas (centrais) publicada no jornal Avante (de 7 de Agosto de 1988), assinada pelo jornalista Henrique Custódio:



Álvaro Cunhal na "Festa da Amizade":
Se não pode haver comício, conversa-se mesmo à chuva!

Não foi difícil chegarmos ao local da Festa, no Laranjeiro: a música, primeiro - que se ouvia muita estrada antes - os pendões e bandeiras ondulando pelo recinto - que se viam depois, muitos metros ainda ao longe - levavam lá o mais distraído.
(...)
Quando lá chegámos ao princípio da tarde de domingo (ainda a nebulosidade se parecia com os chamados "céus encobertos" a que ninguém passa cartão nem chapéu de chuva), a multidão percorria ronceiramente o recinto, espreitando aqui, comprando acolá, sentando-se onde calhava, abancando nos (numerosos) restaurantes e similares, festejando reencontros com amigos - que é coisa vulgar nestas iniciativas - fazendo escalas frente aos palcos, irresistivelmente atraídos pelos espectáculos ali apresentados.
E quanto a espectáculos, a Festa da Amizade não deixou créditos por mãos alheias: fizeram parte do programa de três dias nomes como a Companhia de Teatro de Almada, "Os Delfins", Sérgio Godinho, Nuno Gomes dos Santos, Jorge Lomba, Fernando Tordo, Luísa Basto, Francisco Seia e banda, Maria Guinot e Carlos do Carmo. Para além de bandas a percorrer o recinto, fado amador (em local próprio), exibição de ranchos folclóricos, etc.
... E antes da chuva ainda pudemos apreciar mais alguma coisa.








Enquanto no recinto desportivo duas equipas de jovens mostravam que Portugal é um viveiro de talentos futebolísticos e José Barata Moura encantava miúdos e graúdos num palco um pouco ao lado, na outra ponta da Festa cantava-se o fado a preceito, no retiro-restaurante montado para o efeito e abrindo guitarras e microfones a todos os "espontâneos" que quisessem mostrar o que sabiam. Quem sabia, de certeza, do que é cantar o fado na sua intrínseca dimensão popular eram os camaradas que construíram o espectáculo, mantendo-o vivo, criativo e interveniente num enquadramento festivo que até nem é muito propício ao sossego que este tipo de espectáculo pede.

Mas havia outros "enquantos" (...) Era o caso dos espectáculos no palco principal, a decorrer "taco a taco" com a criação de um grande painel fronteiro subordinado aos temas da Paz e da Amizade e executado, durante os três dias da Festa, pelo Núcleo de Artes Plásticas da Comissão de Juventude da Junta de Freguesia do Laranjeiro, ou da animação do Café-Concerto a par de não menos animadas competições de jogos populares, ou da excelente exposição sobre as "memórias" do ensino durante o regime fascista (com a exibição de antigos manuais, de textos e imagens de propaganda salazarista, etc.) ao lado de outras que iam do artesanato às questões laborais, da pintura à luta política e social.


Intervindo, participando, passeando, fruindo tudo isto ao longo de três dias, pessoas que, à
semelhança dos anos anteriores, demonstraram claramente que a Festa da Amizade é já um património do concelho de Almada.
(...)




Entretanto chegou a hora do comício, acompanhada por uma carga de água que se manteria pela noite fora. Ainda se fez um compasso de espera, na esperança de que o tempo melhorasse, mas como tal não se verificou, anulou-se, naturalmente, a iniciativa (...) e optou-se por uma solução de recurso: a utilização do sistema sonoro da Festa (que não tinha as "electricidades" afectadas pela chuva) para que o orador dirigisse algumas palavras à multidão que o aguardava. Palavras que iriam resumir, de improviso, o extenso discurso que Álvaro Cunhal havia preparado, como ele próprio informou.





O "resumo" do "extenso discurso" de Álvaro Cunhal está disponível abaixo, no fac-simile das páginas da mencionada edição do Avante (cliquem sobre as imagens para ampliar e ler o texto).

Antes desse improvisado "não-comício", fizeram-se as intervenções da praxe: Comissão Concelhia de Almada do PCP e Comissão Concelhia de Almada da JCP...

Se não se importam, olhem novamente para a fotografia que está no topo deste artigo. Estão a ver aquele jovenzito que aparece atrás do grande Álvaro Cunhal? Repararam no ar triste do dito jovenzito? Pois: é que esse jovenzito era o representante da JCP e ficou "chateado" porque, depois de tanto trabalhinho a escrever a sua intervenção política (era a sua vez de "falar às massas"... e talvez mesmo a sua última oportunidade para o fazer, pelo menos enquanto
membro da "jota" - pois já tinha 24 anitos, coitado...) vira-se obrigado (por força da tal carga de água) a resumir em duas ou três palavras o que lhe "ia na alma": breve saudação a toda a gente e a afirmação de que «podem sempre contar com a JCP».

E como é que eu sei isso? Porque estive lá! Aliás eu era (sou...) o tal jovenzito chateado com o raio do tempo, que havia de trazer tamanha carga de água em Agosto, e logo nesse dia, e logo à hora do comício da Festa da Amizade de 1988, em que ele (eu) fora o escolhido para botar discurso!
Foi galo! (Expressão que, como se sabe, era muito utilizada nesses míticos anos 80...)



(Nota final: para evitar confusões, e dar o seu a seu dono, o texto de Henrique Custódio, publicado na reportgem do Avante está destacado com uma cor diferente...)

3 comentários:

mio disse...

Lembro-me bem da Festa da Amizade e acho qeu foi lá que assisti ao meu primeiro concerto: o Zé Barata Moura :')

Debaixo do Bulcão disse...

Pois é, Ana, eu conheci-te uns anitos mais tarde e ainda eras uma "criancinha"... eh eh eh...

A.V.

Unknown disse...

Falta fazer referência ao terreno frente ao então centro de trabalho onde é agora o pingo doce na cova da piedade, onde se realizou pelo menos uma festa da amizade