Ainda me lembro destes dois.
O da esquerda era o "soviético típico": frio, calculista, composto, russo. O da direita era o contrário: criativo, imprevisível, com a barba por fazer, azeri, "dissidente" - e, talvez não por acaso, soviético, também.
Frente a frente, protagonizaram, em 1984, em Moscovo, "um torneio épico que durou cinco meses e que acabou interrompido sem um resultado conclusivo" (fonte: BBC Brasil).
Esse "torneio épico" era o quê? A disputa do título mundial de Xadrez (já que, como se deduz pela imagem, não poderia ser nenhum combate de Rocky Balboa nem nenhuma batalha de Rambo)?
Era, pois: era o frente a frente entre os dos melhores xadrezistas da época, a competir pelo título maior da modalidade.
Mas foi, em termos simbólicos, muito mais que isso.
Foi visto e seguido atentamente em todo o mundo (pelo menos em todo o "mundo ocidental") como um "épico" confronto entre o "comuna" representante do regime soviético (Karpov) e o "dissidente" (Kasparov) com o qual todas as "democracias ocidentais" se identificavam.
Ah, pois: por acaso, eram também dois mestres do Xadrez mundial - e esse "duelo épico" muito contribuiu para a divulgação e crescimento da modalidade. Acabou empatado (como empatado estava a correlação de poderes daquela época), mas serviu para fomentar, à esquerda e à direita, um entusiasmo até aí nunca visto por uma modalidade tão pouco dada a exuberâncias "clubísticas".
Comigo, sinceramente, não resultou: continuo um nabo a jogar xadrez.
Mas lembrei-me da efeméride porque alguém teve a brilhante ideia de, 25 anos depois, reunir de novo Anatoly Karpov e Garry Kasparov, frente a frente com um tabuleiro entre eles. E desta vez parece que até pode ser mesmo, e só, para jogar.
Lá vai disto: "O torneio, que obedecerá a limites de tempo rigorosos, teve início nesta segunda-feira e terminará na sexta-feira, dia 25. Os jogos serão transmitidos ao vivo no site da prefeitura de Valência. Os organizadores esperam que milhões de fãs acompanhem o embate de titãs." (BBC Brasil).
É interessante notar que, desde os anos 80, ambos não mudaram assim tanto. Continuando a citar a BBC: "Kasparov, hoje com 46 anos, vem-se preparando para o duelo na Noruega, jogando com o adolescente prodígio Magnus Carlsen." Já Karpov, de 58 anos, o calculista (que, poucos anos mais tarde do "duelo histórico" com Kasparov teve outro não menos histórico com um computador chamado "Deep Blue"), "vem treinando com um computador" (olha a grande surpresa!) "e um grupo de mestres em Espanha".
De Karpov, "o soviético", não conheço qualquer actividade política recente. Mas - diz a BBC - Kasparov é "hoje um dos líderes da oposição na Rússia".
Enfim, talvez afinal até tenham mudado em alguma coisa. Ou não...
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