sábado, junho 26, 2010

O Metro Sul do Tejo, ou mais uma crónica de um país onde tudo se faz muito devagarinho

O primeiro protocolo entre governo e autarquias para a implementação do Metropolitano do Sul do Tejo (MST) foi assinado há 15 anos (precisamente, no dia 18 de Abril de 1995). E previa desde logo o traçado actual, mas muito maior extensão de linhas - ainda na primeira fase devia chegar ao Barreiro e à Costa de Caparica. Não era o "metro de Almada" (como há quem lhe chame hoje). Era, e é, um projecto que se pretende estruturante para as acessibilidades (ou a mobilidade, para usar um palavrão mais na moda) das populações do "arco ribeirinho do Tejo" (concelhos de Almada, Seixal, Barreiro e Moita). Só começou a funcionar em 2008.

A Câmara de Almada, que sempre esteve na vanguarda deste projecto, tinha lançado a ideia por volta de 1985 (faz agora 25 anos, e uma década antes do primeiro protocolo). Não sei exactamente porque só dez anos mais tarde um governo e as autarquias locais chegaram a acordo. Mas lembro-me, ainda relativamente bem, desse primeiro trimestre de 1995, quando o processo parecia começar, finalmente, a entrar nos carris.

Enquanto jornalista do quinzenário Sul Expresso fui acompanhando esse assunto. Eis a cronologia dos acontecimentos de 1995, tal como apareceram nas páginas daquele periódico.

A primeira referência ao assunto aparece em Fevereiro desse ano. "A assinatura do contrato de fornecimento do Anteprojecto da Rede Base do Metropolitano Ligeiro da Margem Sul realizou-se no dia 29 de Fevereiro no edifício da Presidência da Câmara Municipal do Seixal", com a presença dos municípios envolvidos - Seixal, Moita Barreiro e Almada - do então secretário de Estado dos Transportes, Guilhermino Rodrigues, e de um representante do consórcio francês liderado pela Semaly-HP-Pret, responsável pela elaboração do "anteprojecto".

Este anteprojecto era, de facto, um estudo de viabilidade técnica e económica, uma vez que, segundo o Sul Expresso, o consórcio iria "efectuar a descrição dos previsíveis financiamentos, referindo vantagens e inconvenientes de cada, para além dois montantes de participação atribuídos a cada entidade que venha a envolver-se no referido projecto", bem como "desenvolver e complementar os aspectos geológicos e topográficos de um estudo da viabilidade da extensão da rede até ao concelho da Moita". (Artigo da jornalista Ana Isabel Borralho).

Note-se, então, que esse primeiro documento já previa a ligação - logo numa fase inicial - dos concelhos de Almada, Seixal e Barreiro, com posterior ligação à Moita.

Isso mesmo adiantava o Sul Expresso (em artigo meu, e julgo que com alguns conteúdos em "primeira mão"), na edição de 29 de Março. O jornal divulgava a planta da rede prevista, tal como fora apresentada (mas não muito divulgada) a 20 desse mesmo mês. "O estudo de viabilidade técnica e económica foi concluído e entregue ao ministro Ferreira do Amaral. No passado dia 20 foi publicamente apresentado (...) em cerimónia que contou com a presença do coordenador do estudo, Fernando Nunes da Silva".

Falou-se de números, nessa apresentação. Segundo a presidente da Câmara de Almada, Maria Emília de Sousa, esperava-se "um investimento da parte do Governo de 45 a 60 milhões de contos, com recurso a Fundos Comunitários" e o restante investimento ficaria "a cargo da empresa que vier a contruir e a explorar a rede". Note-se, então, que desde logo tinha ficado assente que a empresa que construísse a rede seria a mesma que a iria explorar. Dito de outra forma: quem explora o serviço teria a "obrigação" de construir os equipamentos.

Apontavam-se também datas. A primeira fase, "fazendo a ligação Barreiro/Almada/Pragal" devia estar concluída em 1999. Ou mesmo antes disso (por volta do final de 1997) porque "a tecnologia utilizada permite a abertura de troços quilómetro a quilómetro" , como garantia o coordenador do estudo de viabilidade.

No dia 5 de Abril, a Câmara de Almada aprovava o estudo, em sessão pública, "por unanimidade e com direito a palmas" - como reportava o Sul Expresso (Ana Isabel Borralho) - e com declarações de voto a favor do projecto por parte de vereadores da CDU e do PSD. No que dizia respeito a contas, "caberá às câmaras pagar 20%, ficando o governo, através da CP, responsabilizado em 80%, ou seja: 150 mil contos a CP e 7.500 contos cada câmara".

Faltava só formalizar a parceria governo-autarquias, com a assinatura do "protocolo para o desenvolvimento do metropolitano ligeiro na margem sul do Tejo". Esse momento tão aguardado chegou a 18 de Abril de 1995, nos Paços do Conselho da Câmara Municipal do Barreiro. E eu tive a sorte, ou o privilégio de fazer a cobertura desse acontecimento que se supunha histórico (na verdade acho que tive mas foi a lata de me oferecer - e insistir muito - para fazer esse "serviço").

Com praticamente tudo dito por parte das autarquias e dos autores do estudo, esperava-se muito da intervenção do então Ministro das Obras Públicas, Ferreira do Amaral. E ele não defraudou as expectativas. Garantiu a disponibilidade do Governo para apoiar a concretização da obra pública. Mas fez mais. Fez uma grande declaração de intenções sobre a importãncia de investir no desenvolvimento dos caminhos de ferro para "revolucionar os meios de transporte", de forma a "transportar mais pessoas, mais frequentemente, mais utilmente e com maior comodidade".

Poucos meses mais tarde, mudava o Governo. Com o novo Executivo, todo este trabalho volta para a gaveta. E as populações do "arco ribeirinho do Tejo" continuam (até hoje!) a ter de fazer percursos estranhos e pouco lógicos para se deslocarem de transportes públicos entre dois grandes centros urbanos, ainda por cima tão próximos, como Almada e Barreiro!

Passam 4 anos. Em 1999 (ano que se previa ser o do arranque da exploração do Metro Sul do Tejo!) é assinado um novo protocolo. Mas é preciso aguardar ainda mais 2 anos até que, em 2002, a obra é finalmente adjudicada... para ficar concluída seis anos mais tarde (mas só numa ínfima parte relativamente ao projecto de 1995)!

Tudo isto já passou à História, dir-me-ão.

Pois passou. Mas era bom que a gente aprendesse alguma coisa com a História. Para quê? Para não repetirmos asneiras do passado, por exemplo. Não é uma boa razão?

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