quinta-feira, junho 25, 2009

Como (não) vivi a revolta na Ponte 25 de Abril (Junho de 1994)


Na noite de 23 para 24 de Junho de 1994 (há 15 anos) estava eu a fazer o último turno no departamento de informação da Rádio Voz de Almada. Terminado o serviço (o último noticiário era, salvo erro, à meia-noite), verifico as eventuais novidades recebidas via fax, para deixar aos meus colegas na manhã do dia seguinte. Procedimento normal e quotidiano...

Nos faxes, nada de especial: era véspera de feriado em Almada, poucas notícias e apenas uma convocatória de camionistas que convidavam a comunicação social a aparecer no Centro Sul na manhã seguinte...

Pois... Embora aquilo fugisse um pouco ao "normal", confesso que não adivinhei o que aí vinha. Deixei, portanto, os faxes (incluindo esse) no local do costume, para os meus colegas verem na manhã seguinte. E lá fui à minha vida: era noite de São João, havia arraiais por toda a cidade (94 e 95 foram, de resto - desde que me lembro, e se bem me lembro - os anos em que se fizeram mais arraiais populares em Almada), e no dia seguinte até estava de folga.

Portanto, depois de um dia de trabalho duro, festejei bravamente (work hard, party harder, lembram-se?).

Dia seguinte: rádio primeiro, têvê depois (já havia quatro canais... - ou melhor: ainda só havia quatro canais) surpreendem-me com directos da Praça da Portagem. Camiões a bloquear o trânsito, povo a aplaudir e a apoiar, Governo (liderado pelo PSD do então primeiro-ministro Cavaco Silva) nervoso, ministro da Administração Interna (Dias Loureiro) a desembarcar de helicóptero para comandar, no local, as "tropas" que haviam de desimpedir o local - à bastonada - e desmobilizar o protesto (contra o aumento das portagens, para quem não se lembra ou não sabe).





Penso eu com os meus botões, e em vernáculo: porra, devia ter adivinhado isto! Ao telefone com a directora de informação da Voz de Almada, comento o que se passa. Pergunta-me ela: gostavas de estar lá, não? E eu faço como os políticos: não confirmo nem desminto, antes pelo contrário (claro que gostava de ter estado a fazer a cobertura desse dia histórico - mas uma cabeça iluminada daquela rádio tinha-me proibido de fazer trabalho fora das horas de serviço!).


Sorte a minha: aquilo foi apenas o princípio da grande contestação popular que - em última análise - teve como consequência a derrota do PSD nas legislativas de 1996, após dois mandatos de maioria absoluta (e arrogância se não absoluta pelo menos muito... arrogante!). Felizmente para mim, consegui acompanhar, ainda, as movimentações que se seguiram: a criação de dois movimentos de utentes, os protestos em forma de "buzinão" ou de complicação de trocos e, no final, um certo pedido de desculpas aos portageiros pelos incómodos causados - porque, afinal, o alvo dos protestos era o governo, não os "pobres" funcionários.


Felizmente para o país, a derrota do PSD nas eleições de 1996 levou ao poder um PS preocupado em repôr alguma justiça social (embora numa versão "beata" ao estilo António Guterres) e não um PS tecnocrata e mais-do-mesmo.


Dúvida final, em jeito de nota de rodapé:O ano passado, por esta altura, a comunicação social comemorou a preceito mais um aniversário da "revolta da ponte". Este ano, népia. Porquê?

(Obs: as fotografias - de autor que desconheço - foram publicadas na Revista Sem Mais, número 7, de Agosto de 1994. Reproduzo-as aqui, com a devida vénia - e mencionando a fonte, porque é assim mesmo que se deve fazer.)





PS - Reportagem da carga policial, transmitida em directo pela SIC, disponível em

1 comentário:

Debaixo do Bulcão disse...

Outro PS - Se procurarem no Google "rádio voz de almada" encontram artigos (e vídeos) meus sobre a minha experiência nessa rádio; e encontram um blogue de 2007, em nome dessa mesma rádio, com uma extensa lista de pessoas que por lá passaram, mas na qual o meu nome não está incluído. Não me perguntm porquê, pois eu não vos saberei responder...

António Vitorino