terça-feira, janeiro 08, 2008

Imagine...


Imagine o leitor que alguém que não gosta de si (ou que está, apenas, chateado consigo) resolve fazer-lhe uma partida... digamos uma partida daquelas de Carnaval.
Imagine o leitor que essa pessoa é amiga de alguém que tenha um pequenino cargo numa instituição descentralizada do Estado, tipo... deixa cá ver... tipo delegada de Saúde do Concelho de Almada.
E imagine, já agora, que essa pessoa - que não gosta de si, ou que está chateada consigo - mete uma “cunha” à delegada de Saúde do Concelho de Almada para que esta titular de um cargo do Estado apresente num tribunal uma queixa contra si, vulgar cidadão, e isto porque... porque... Hum...aqui a coisa começa a complicar-se... Uma queixa contra si, porque... Porquê??? Alguém quer dar palpites?
Ora bem... parece que o caro leitor não cometeu nenhum crime, não é suspeito de ter cometido nenhum, nem sequer existem motivos para crer que você esteja a planear fazê-lo... Portanto, uma queixa (uma queixa da delegada de Saúde, não do Zé do bar da esquina, note-se) talvez não, talvez seja demais... mas (que tal esta dica, já que estamos a falar de saúde?) porque não apresentar um pedido a esse tribunal para que o caro leitor seja presente a uma consulta psiquiátrica? Pode ser uma boa forma de o intimidar, não lhe parece?
E porque havia o caro leitor de ser presente a uma consulta psiquiátrica? O caro leitor está com problemas comportamentais? Bem... vamos admitir que a pessoa que foi meter a “cunha” à delegada de Saúde do Concelho de Almada pensa que sim, embora não saiba muito bem como fundamentar essa suspeita (e passemos, por agora, adiante no que diz respeito aos problemas comportamentais – não fictícios mas, infelizmente, bem reais - dessa mesma pessoa que faz a queixa à delegada de Saúde).
Vamos, então, admitir que sim senhor, que o caro leitor até precisa de acompanhamento psiquiátrico (algo que até nem seria de estranhar, nos dias que correm, e numa sociedade onde os problemas se “resolvem” com medicamentos que “tratam” os sintomas sem atacar a origem da doença... no caso de se tratar mesmo de uma doença). Então, para que alguém peça a um tribunal que você seja levado a uma consulta psiquiátrica... bem... isso significa que o seu caso é grave, e grave de uma forma muito evidente!... Parece que você, caro leitor, tem problemas sério, que não só o afectam a si próprio,mas também aos que o rodeiam (e que, por essa razão, se sentem ameaçados pelos seus actos).
E parece também que você se andou a baldar: não foi às consultas que (devido ao seu comportamento) aqueles que lhe estão próximos, e "só querem o seu bem", lhe marcaram, ou – pior! - recusou que lhe marcassem consultas, acha que isso de consultas psiquiátricas é só para “os malucos”... (ou então está tão mal, anda tão fora da realidade, que nem consegue tomar as suas próprias decisões – mas, sinceramente, esta última hipótese é tão extrema que nem eu próprio não quero crer que seja esse o seu caso, estimado leitor).
Não é nada disso? Nunca lhe falaram, sequer, nessa hipótese de o leitor ir a uma consulta psiquiátrica? E, se não lhe fizeram tal proposta, você também não poderia ter recusado (como é óbvio, não, é?..), logo, não o poderiam obrigar a fazer algo que era apenas para o seu bem, mas que você recusa e, por isso mesmo, tem de ser levado à força!
Pois... Eu já calculava que não era nada disso! Mas então, como justificar o pedido à instituição judicial (e à policial, também) para que esta(s) tome(m) medidas preventivas contra si?... Bem, deixa ver por onde podemos pegar... Já sei: o sujeito (o prezado leitor) deve ser avaliado porque” lava muitas vezes as mãos, e não fala com ninguém” (é absurdo, como tudo o resto nesta história, mas vamos imaginar que é assim mesmo, sic – expressão latina que, como sabem, se traduz em português por “textualmente”) ... Além disso, diz que você, refractário leitor, recusa-se a ir a uma consulta, mesmo que não lhe tenham perguntado, nem proposto nada (parece que há pessoas que o conhecem melhor que você se conhece a si próprio, desprevenido leitor) portanto temos mesmo que o obrigar a ir, para que perca essas manias de lavar as mãos e não falar com ninguém (coisa que, calculo eu, a avaliar pelo que atrás ficou escrito, até nem é verdade – e, de resto, suponho que você até lava as mãos só naquelas ocasiões normais, como depois de ir à casa de banho ou antes das refeições... e não tem problemas em falar com as pessoas, mesmo que às vezes esteja farto de aturar gente parva).
Pequeno pormenor sem qualquer importância: sabe você, caro leitor, não pode chegar ao pé da delegada de Saúde do Concelho de Almada (ou de qualquer outro concelho) e pedir-lhe que accione o sistema judicial português (e uma força policial, e os bombeiros, e o sistema nacional de saúde...) para levar alguém a uma consulta psiquiátrica? Não pode, não senhor! Pelo menos, não o pode fazer com esse tipo de argumentos.
Sabia? Eu sei.
A delegada de saúde do Concelho de Almada também sabe (aliás, ela teve a amabilidade de me esclarecer esta dúvida, quando eu fui pesquisar algumas coisas para elaborar esta historieta - que já se sabe, só pode ser pura ficção... - e lhe perguntei se - imaginemos... - eu tivesse em casa alguém que colocasse sistematicamente em risco a sua saúde e a dos outros, poderia eu pedir à senhora delegada que fizesse entrar num tribunal um pedido para que essa suposta pessoa fosse intimada pelas forças policiais a apresentar-se numa consulta psiquiátrica). Foi-me respondido que, nesse caso, eu não o poderia fazer... Mas – lá está – isso é um pormenor que, se você for amigo (ou amigo de um amigo) de alguém que seja titular do cargo público, não terá importância absolutamente nenhuma. Como se viu neste caso – que, de tão estranho, só pode ser inventado, já se vê... (Deve ser por isso que se costuma dizer que um gajo sem amigos não é ninguém.)
Hummm... Depois de ler estas coisas, o caro leitor deve achar que, se calhar, quem precisa mesmo de acompanhamento psiquiátrico sou eu, que ando para aqui a disparatar alarvemente, não é?
Aliás, para inventar coisas tão parvas, tão absurdas, devo estar a delirar. Ou então estou drogado. Só posso!
Onde é que já se viu alguém chegar com argumentos desses a uma autoridade de saúde? Bem... se calhar até já se viu... Mas onde é que já se viu uma autoridade de saúde dar seguimento a uma “queixa” tão mal fundamentada? Nããão! Não pode ser!
Agora, só faltava que (imaginando nós que havia um tribunal disposto a acolher semelhante “queixa” sem fundamento) algum Meretíssimo Doutor Juíz resolvia dizer que sim senhor, o sujeito de quem se diz (diz-se, apenas, sem provas) lavar muitas vezes as mãos e não falar com ninguém deve ser notificado para ir a uma consulta de Psiquiatria, e que a notificação lhe deve ser entregue por uma autoridade policial – que, no caso do sujeito em questão – você, caro leitor - seria a GNR (Guarda Nacional Republicana).
Mas – melhor ainda – calcule que a delegada de saúde do Concelho de Almada, não sabendo o seu nome mas conhecendo a sua residência (vamos admitir que você se chama António Carlos Ferreira Vitorino, e mora na Rua Sopa de Urtigas, Lote 45, Bairro do Picapau Amarelo), pede ao tribunal que notifique um António Carlos Mota Ferreira, residente na Rua Sopa de Urtigas, Lote 45, Bairro do Picapau Amarelo (coisa que só poderia acontecer se esta história fosse real – e não pode ser, não é?), e o tribunal entrega à GNR uma notificação em nome desse António Carlos Mota Ferreira (que, pelo menos nesta história, não existe, como já vos expliquei).
Ainda melhor: e que tal se for interpelado pela GNR, na via pública, porque os dois agentes da autoridade, depois de muito olharem para si, ficam convencidos que você é mesmo a pessoa que eles procuram (repare o caro leitor que você, supostamente, não é suspeito de nada – porque não cometeu nenhum crime, tem o seu cadastro limpo, e nunca manifestou intenção de fazer nenhum acto ilegal - mas a GNR “identifica-o” visualmente na rua, como se tivesse a sua foto em algum ficheiro, ou como se alguém o tivesse apontado a dedo - ou seja, denunciado, por um crime que você não cometeu, não se preparava para cometer, e, aliás, nem isso sequer lhe tinha passado pela cabeça!) .
E então, perguntam-lhe se você é o tal António Carlos Mota Ferreira, residente na Rua Sopa de Urtigas, Lote 45, Bairro do Picapau Amarelo e se não se importa de os acompanhar até ao posto, onde têm um papel para você assinar, coisa que não demora nada e até o lhe dão boleia depois, de regresso ao local onde o encontraram – ou seja, à tal paragem de autocarro (o que siginifica também uma de duas coisas: ou eles são espertos e você, leitor, é estúpido; ou então convenceram-nos mesmo que iam levar um maluquinho ao hospital – o que deve ser mais ou menos a mesma coisa, não é?...)
Imagine agora, prezado leitor, que nesse dia você até estava sem documentos de identificação. Quer dizer: você assegurava que não senhor, o seu nome não correspondia ao da suposta pessoa que eles procuravam. E perguntavam-lhe, então, se a morada era a mesma. E o leitor, como não queria mentir à autoridade, respondia que sim, a morada correspondia, embora o nome fosse diferente. E, porque não queria ser acusado de resistir à autoridade, lá ía... assinar o tal “papelinho” e ficar à espera que os agentes o levassem de volta ao local onde o interpelaram (ingénuo leitor!...).
Coisa tão estúpida, não é? Obviamente, assim que o desprevenido leitor chegasse ao posto da GNR, tal excesso de zelo seria logo rectificado: você não tem o nome que está no tal “papelinho” (emanado pelo tribunal), portanto, o tal “papelinho” não seria válido, não é?
Afinal, vivemos num Estado de Direito, e mesmo que, por hipótese absurda, a delegada de Saúde tivesse pedido ao tribunal para emitir essa ordem (coisa que, nessas circusntâncias, não tem legitimidade para fazer), e se, por hipótese ainda mais absurda, o tribunal tivesse emitido tal ordem, ela não seria válida, porque a pessoa notificada não existe... pelo menos não existe naquela residência. Logo, o mais natural seria rectificar o erro, e mandar embora o “suspeito” (de quê?) identificado visualmente (como?) por engano. Seria, não seria?
Pois. Mas então, se em vez disso os agentes da autoridade “corrigissem” o seu nome, alegando que “se a morada era aquela, então você é a pessoa que procuramos”?
E então lá o faziam esperar, suponhamos que no posto da GNR da Trafaria, e – ah, pois, já me esquecia – sem nunca lhe dizerem exactamente onde o levavam (apenas “a uma consulta” – embora você, leitor, que não é estúpido, já tivesse percebido qual a “especialidade”).
E isso durante cerca de uma hora, sentado num banco de madeira, à espera de uma ambulância dos Bombeiros que tinha sido “fretada” expressamente para o levar (é que os bombeiros, tal como a GNR, tal como os tribunais, tal como a delegada de Saúde, não têm, aparentemente, coisas importantes com as quais se preocupar), a ver os senhores agentes embevecidos pelo serviço bem cumprido (levar um maluquinho ao hospital) e, ainda por cima, perguntando-lhe (pergunta retórica, já se vê...): “você sabe a que consulta vai, não sabe, senhor António?”.
Perguntará agora o caro leitor como terminaria esta história, se fosse real.Alguém que é levado, desta forma, escoltado por um elemento da GNR e dois bombeiros, a uma consulta de Psiquiatria (urgência psiquiátrica do Hospital Curry Cabral, em Lisboa, no dia 2 de Outubro de 2007), tem certamente problemas graves – mesmo que escreva num blogue uma historieta em jeito de auto-justificação, não é assim?
Será?
Imagine, caro leitor, que esta história tinha acontecido mesmo, e que tinha acontecido consigo (é tão absurda que parece não ser possível, mas, mesmo assim, imagine).
Você ficava, impávido e sereno, à espera que lhe fizessem a próxima?

11 comentários:

Debaixo do Bulcão disse...

Este texto tem algumas "gralhas" evidentes, e algumas passagens que parecem não fazer nenhum sentido.

A culpa foi do software, que estava sempre a dar problemas (e, como não tenho computador próprio, uso os que me disponibilizam, durante pouco tempo e, por isso mesmo, muitas vezes tenho de terminar os textos à pressa, sem oportunidade para lhes fazer uma revisão).

Ou então foi culpa minha, que já nem sei escrever uma coisa com pés e cabeça.

(Fica, como se costuma dizer, ao vosso critério)

A.V.

Abrenúncio disse...

Eh pá, está aqui um caso de complicadíssima resolução.
Se se trata de uma teoria da conspiração provavelmente emigraria para bem longe, ou então ficaria e teria que contra-atacar com armas mais poderosas do que as deles.
Saudações do Marreta.

Luis Eme disse...

Apenas uma dúvida, se esse dito António Ferreira, existisse, era assim tão perigoso, bicho para ter dois metros e ter força de elefante? Não havia maneira (na história), claro, de o colocar na ordem?

Não há nenhum pau perdido numa esquina que comece a desatar à paulada ao dito cujo (nas histórias, ás vezes aparecem paus tramados...)?

Nota: Continuo a espera do meu "Debaixo do Bulcão"...

Debaixo do Bulcão disse...

Marreta:

claro que isto aconteceu mesmo. E é óbvio que não pode ficar impune.

O que me custa é ver que as pessoas a quem contei este caso, parecem achar "normal" que uma parte do aparelho do Estado português (serviço nacional de saúde, sistema judicial, bombeiros, forças policiais...) seja mobilizada desta maneira para fazer um favor pessoal (porque, caso não tenham entendido, é disso mesmo que se trata: alguém pediu à delegada de saúde que fizesse isto... e ela fez mesmo, embora não tenha competência para o fazer!).

Há quem diga que não vale a pena eu insistir, dizem-me que desista, que siga em frente... porque o recuso à Justiça é lento e pode até não resolver nada!

Mas acontece que isto não foi um caso isolado (quem me fez isto já fez antes muitas outras) e eu sempre segui em frente, esqueci, tentei fazer a minha vida...

Agora, foram longe demais!

De alguma forma, isto terá de ser resolvido!

Estranho, também, que alguns dos meus "colegas" jornalistas (acho que as aspas eram para colocar ali) a quem contei o caso também não vêm aí matéria informativa!

Caramba! Vivemos já num país onde ilegalidades destas se tornaram tão "normais" que já nem são notícia?

António Vitorino

Debaixo do Bulcão disse...

Luís: pois é, só falta mesmo isso, aparecer esse "pau tramado".

Quanto ao bulcão, garanto-te alguns exemplares no final do mês, na próxima sessão de Poesia Vadia.

Entretanto, tenho deixado alguns no balcão de entrada do Fórum Romeu Correia, no Centro de Informática do M. Bica, e na Casa Amarela (Centro juvenil de Santo Amaro, no Laranjeiro).

Às vezes esgotam, mas eu ando a tentar repor o "stock" regularmente.

A.V.

Debaixo do Bulcão disse...

Ah, pois: no caso de alguém ter ficado com dúvidas quanto à minha sanidade mental (sabe-se lá se os outros não tinham mesmo motivos para fazer o que fizeram, não é?) que tal experimentarem falar comigo, antes de tirarem conclusões apressadas?

Eu posso andar um bocado chateado com estas merdas (pudera, não é?), mas garanto-vos que não mordo!
Portanto, se quiserem saber alguma coisa, perguntem: é uma boa maneira de tirarem as dúvidas, e de verificarem se tenho, ou não, razão!

Vitorino

Abrenúncio disse...

A GRANDE FARRA BLOGOSFÉRICA 2008! (18 DE JANEIRO / SEXTA-FEIRA / 20 HORAS) - CONTAGEM DECRESCENTE!

Visita o-marreta.blogspot.com

Saudações,
O Marreta.

Madalena Barranco disse...

Olá António!!! Mas que história é essa?! A vida e seu cotidiano nos oferece um livro, ou melhor dizendo: uma página a cada dia - heheh! Beijos.

LUA DE LOBOS disse...

CADA UMA QUE FICO A SABER MAIS ME CONVENCE QUE A MINHA CAPACIDADE DE FICAR ABISMADA CONTINUA A EXISTIR... tu és maluco???
pois se calhar és porque não vais desistir de acabar essa farsa.
Mas olha junta-te ao Clube.
Também nunca desisto e olha que embora em vias de extinção, se calhar, somos mais do que imaginamos :)
xi
maria de são pedro

Debaixo do Bulcão disse...

Madalena: isto é apenas um das muitas malandrics que me têm feito, às quais eu não tenho reagido. Desta vez vai ser diferente.

Debaixo do Bulcão disse...

maria de são pedro:

obrigado pela visita, e pelo comentário simpático.

Não vou desistir de denunciar esta farsa (e não de a "acabar", já que nem fui eu quem a comecei e preferi não estar metido nela).

Se sou maluco... bem, eu estou a referir-me a coisas devidamnte fundamentadas, e documentadas. Acha que estou a inventar?

Aliás, fui eu quem inventou alguma coisa, nesta "farsa"?

cumprimentos

António Vitrino