(Alexandre Castanheira e António Vitorino, juntos e ao vivo, durante a sessão de Poesia Vadia de Janeiro 2008, na Casa do Algarve do Concelho de Almada. Foto de Ermelinda Toscano) Alexandre Castanheira, grande homem de Cultura, e grande almadense, comemora hoje 80 anos de vida.
Nestas ocasiões, é costume cantar "parabéns a você"... Mas porquê? Porque alguém faz anos?Nesse caso que tal "feliz aniversário"? Tem mais lógica, não tem?
Portanto: feliz aniversário, Alexandre Castanheira.
Mas parabéns, na mesma!
Não por fazer 80 anos (está bem, isso já é obra... mas "para chegar a essa idade basta estar vivo", como diria uma "socialite" portuguesa que é famosa por dizer esse tipo de parvoices...).
Parabéns, sim, Alexandre Castanheira, mas por fazer muitos e muitos anos a ser quem é: um escritor de talento, um dinamizador cultural sempre pronto a incentivar os novos talentos que lhe aparecem pela frente (e eu que o diga!...), um professor universitário muito estimado pelos seus alunos - e, acima de tudo (na minha modesta opinião), um incansável lutador pela liberdade e a justiça social.
Aliás - e corrijam-me, se estiver enganado... - poucas pessoas merecem tanto a comenda da Ordem da Liberdade que, em boa hora (aliás, com algum atraso) lhe foi atribuída.
Para dizer a verdade, eu cá não conheço mais ninguém que a merecesse mais do que ele.
(Mas isso sou eu, que conheço pouca gente...)
E pronto, a partir daqui não tenho muito mais a acrescentar. Porque não tenho jeito nenhum para fazer discursos de circunstância.E porque, bem vistas as coisas, não conheço assim tão bem o Alexandre Castanheira.
Ora deixa cá ver que mais poderei dizer sobre ele...?
Que nos conhecemos em 1980, ou 1981, ou 1982 (ai esta minha memória!...) numa iniciativa da Câmara de Almada?...Está bem, pode ser.
Aqui vai, então, a história (arriscando-me, no entanto, a falar mais de mim do que dele):
Em mil novecentos e oitenta e... bem, num desses anos, era eu um jovenzito, estudante da Escola Secundária do Pragal (nono ano, opção de Teatro, com a professora Maria Santos...) e tinha muita vontade de fazer "coisas" culturais - só não sabia muito bem, ainda, que "coisas" poderiam ser essas.Por essa altura, a Câmara de Almada (que, aqui para nós que ninguém nos ouve, se calhar também queria fazer "coisas" culturais, mas se calhar também não sabia muito bem que "coisas" poderiam ser essas) organiza, na Rua Conde Ferreira (em frente ao actual ex-Teatro Municipal de Almada), um encontro de escritores, ao qual deu o pomposo nome de Festival Internacional de Poesia.
E, para tornar a coisa não só "internacional", mas também "popular", resolve a autarquia fazer uma noite destinada a jovens e/ou novos autores que se afoitassem a subir ao palco e ler textos poéticos, de sua própria autoria, ou de outros.Ora, este vosso amigalhaço que, já nessa altura, tinha a mania que era poeta (e queria fazer "coisas" culturais...), chega-se à frente e vai ler poemas de José Gomes Ferreira, de Almada Negreiros, de um tipo qualquer que usava óculos e (dizem as más línguas...) costumava apanhar bebedeiras no Chiado, e ainda um de sua própria autoria (muito mau, sublinh-se), intitulado "Operário do Sonho" (texto que, se existir ainda - e espero que já não exista - estará em Moura, com o Jorge Feliciano e a Andreia Egas).
É claro que o jovenzito foi muito aplaudido (não sei se apenas por condescendência, por ser jovenzito e como tal merecer incentivo, ou por terem reconhecido alguma coragem em ir para ali, no meio de autores consagrados, fazer aquela figura...), e...
Mas espera aí, eu queria falar sobre Alexandre Castanheira, não era?
Pois.. Então, o Castanheira vem ter comigo (já não me lembro dos pormenores, mas veio ter comigo) e convida-me a participar num grupo de jovens "bibliotecários" (dinamizadores da biblioteca) da Incrível Almadense. Bem, eu até aceitei o convite, até cheguei a ser sócio da Incrível, e até participei numa reunião desse grupo de jovens. Mas a coisa funcionava muito em
"grupinho" - mentalidade típica das colectividades de então, que não era, de forma alguma, aquilo que eu procurava.
(Além disso - pequeno pormenor... - parece que eles não gostavam muito da minha poesia. E - ainda mais pequeno pormenor - até tinham razões para isso: eu escrevia muito mal, senhores!, mas mesmo malzinho!...)
Mas, nesta história, uma coisa é certa: a primeira porta que me foi aberta para estas coisas da literatura, e o primeiro incentivo, foram (são) da responsabilidade do Alexandre Castanheira.
Portanto, se não gostam do que eu escrevo, se acham que eu devia era estar calado e dedicar-me mais, por exemplo, à agricultura... Olhem, chateiem o Castanheira: se calhar a culpa é dele!
Ah, pois,porque não quero ser hipócrita (desculpem lá, nunca tive muito jeito para isso...), devo acrescentar ainda o seguinte:
Pouco depois dessa minha fugaz experiência como associado da Incrível Almadense, entrei para o Centro Cultural de Almada - que, vejam lá vocês, era uma associação criada, precisamente, por "dissidentes" da Incrível. Ora bem... por isso mesmo (e também porque havia um conflito geracional - e divergências substanciais sobre a forma de entender a actividade cultural - entre os "velhos" das colectividades e os "novos" do Centro Cultural), Alexandre Castanheira (tal como Romeu Correia, aliás), não eram propriamente pessoas muito estimadas naquele meio. Eu próprio (que fazia parte dos "jovens" contra os "velhos", como é bom de ver...) acabei por, em determinada altura da minha vida, menosprezar o trabalho, e a importância do Castanheira.
Erro meu!...
Durante algum tempo, textos como, por exemplo, o "Chico do Norte" eram, para mim, exemplo de um tipo de intervenção político-cultural "ultrapassada", por ser excessivamente "doutrinária" e, eventualmente, "populista" - logo, ineficaz.
Enfim... Talvez esse tipo de análise tivesse cabimento, no contexto (sonhado) dos anos 80 e (real) dos anos 90. Não me quero alongar sobre isso agora. Mas a verdade é que hoje (apetece-me dizer "infelizmente"), olho para esse texto e vejo ali uma actualidade pungente: uma história que, neste momento, é necessário recordar. Não digo que seja um grande texto teatral. Mas é uma grande história exemplar.
Ou seja: o que parecia redundante, há dez anos, é hoje, de novo, actual.
Dá que pensar, não é?
Mas ainda bem que há um Alexandre Castanheira, para nos dar que pensar!
(Ah, pois: e para mim, ele não é o Senhor Comendador - é mesmo, tal como era quando nos conhecemos, e como há-de continuar a ser, com o maior respeito e a maior gratidão,
O CASTANHEIRA!)
3 comentários:
Gostei de te ler...
O Alexandre Castanheira é de facto uma grande figura da cultura almadense. Como já te disse, pessoalmente, nunca percebi porque razão nunca foi vereador da cultura cá do burgo...
Talvez tivesse energia, ideias e talento a mais, para os tais anos oitenta e noventa...
Luís: seria preciso saber se ele, Castanheira, gostaria de ter um cargo desses. Achas que sim? (Podemos perguntar-lhe, não é?)
Mas não me apanhas aqui a fazer considerações sobre o pelouro da Cultura nos anos 80.
Nos anos 90, com o Matos, é o que nós conhecemos. E eu estou de acordo com, digamos, "o essencial" das opções da CMA para a Cultura, desde que este vereador lá chegou.
Claro que podia ser melhor.
(Pode sempre ser melhor...)
Mas dificilmente seria pior que nos 80's.
E pronto, calo-me.
A.V.
Ao Alexandre Castanheira (e, já agora, ao Artur Vaz...) peço desculpa pela minha falta de comparência ontem.
Problemas de saúde...
Teremos muitas outras oportunidades para nos irmos encontrando.
A.V.
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