domingo, junho 03, 2007

Sobre "Acções de comandos e terrorismo" (Álvaro Cunhal)



"Para o Partido, a luta de massas é o motor da revolução e é com a luta de massas, é com a acção política, é com um vasto movimento político organizado, que se criam condições para formas de luta superiores, para a acção violenta e a luta armada bem sucedidas, para numa situação de crise revolucionária, se desencadear com sucesso a insurreição popular.

Os radicais pequeno-burgueses têm concepção completamente diversa do processo revolucionário. Eles não consideram a necessidade de definir, de harmonia com a situação e mesmo a conjuntura política, quais a formas de luta a adoptar e quais as principais em cada momento.

Consideram sempre a luta violenta como forma preferencial. Partem não do exército político e da luta de massas para a acção armada, mas da acção armada como forma primeira, central, determinante, para alguns exclusiva, do movimento político. Eles absolutizam a acção violenta como a única revolucionária, como froma determinante de todo o processo revolucionário, independentemente da situação e da conjuntura políticas.

(...)

Concebem a revolução feita por heróis pequeno-burgueses separados das massas, que, pelo exemplo, atraem novos combatentes, multiplicam os grupos armados, forjam o exército revolucionário libertador. A organização política para muitos deles, é decorrente da organização e acção militares. Dos "comandos" surgem a direcção política e o futuro partido.

Estará condenado ao fracasso qualquer grupo que imagina poder desencadear o processo insurrecional a partir da acção violenta de homens isolados, de "homens de acção" sem programa e fora dum movimento político fortemente organizado, alheios à luta de massas, sem consideração pela conjuntura política.

(...)

A acção de agrupamentos desse tipo facilamente conduz ao terrorismo, se o terrorismo não é já o ponto de partida. E o terrorismo pode causar danos sérios ao movimento popular.

(...)

O terrorismo como resposta à repressão, como "repressão da repressão", ou como "excitante", como "estimulante", como "detonador", é já uma velha experiência do movimento revolucionário. Não é com o terrorismo que se vence um governo decidido e capaz de recorrer ao terror.

Numa tal batalha entre dois terrores venceria aquele que dispõe de recursos incomparavelmente superiores."

Álvaro Cunhal, "O radicalismo pequeno-burguês de fachada socialista"
Edições Avante, 1971.


(Obviamente, o "terrorismo" aqui referido não é, nem podia ser, o de grupos como a Al Kaeda. Refere-se, sim a certo tipo de luta "voluntarista"

muito utilizada em determinados momentos históricos por grupos de "extrema-esquerda" ou mesmo anarquistas)

Outra coisita: a polícia alemã está a responsabilizar o grupo Black Block (em alemão diz-se Schwarzer Block ) pelos confrontos em Rostock.
Não sei se é verdade ou mentira (não tenho informação suficiante, para formar uma opinião). Mas já vi, e convido-vos a ver também, informação sobre um grupo argentino com o mesmo nome, em Indymedia.com, e a página da Wikipédia sobre os mesmos meninos.

Ah, pois, e se alguém achar que alguma destas imagens é ridícula, fiquem a saber que a culpa não
é minha: foram eles próprios que as puseram a circular na net.



António Vitorino
(este vendido desavergonhado, porco fascista, etc. etc. etc. ...)

7 comentários:

Luis Eme disse...

Álvaro Cunhal refere-se às Brigadas Revolucionárias do PRP, que obrigaram o PCP a criar a ARA, para não perder a hegemonia no combate à ditadura no nosso país.

Debaixo do Bulcão disse...

No livro, ele refere sobretudo a LUAR... só no que diz respeito a Portugal.
Mas existiam também as "Brigadas Vermelhas", em Itália, ou a "Facção do Exército Vermelho", na Alemanha...
Havemos de falar nisso mais tarde.

Vitorino

Luis Eme disse...

É normal que ele não fale das Brigadas Revolucionárias do PRP (do Carlos Antunes e da Isabel do Carmo) porque ele nunca gostou muito de fazer publicidade às outras forças politicas, Vitorino...

Debaixo do Bulcão disse...

Luís: julgo que, independentemente da força política a que Álvaro Cunhal se referia em concreto (ou para a qual remetia este texto, não interessa para o caso), o pensamento político aqui expresso ilustra bem, e cartacteriza com a precisão possível (possível, porque não se trata de "futurologia"), o tipo de organização que é este "black block" e outros grupos semelhantes - veja-se as referências que eles fazem, por exemplo à "Fracção do Exército Vermelho" - bem como o tipo de acção que eles defendem e promovem.
Claro que existiam outros textos, até mais actuais, sobre este assunto.
Mas eu escolhi este, do Álvaro Cunhal, e não foi por acaso.
É que estou preocupado por ver certas pessoas que até se dizem próximas do PCP (e refiro-me a dois ou três blogs que visito com regularidade) desculpabilizarem, se não mesmo defenderem, grupos que, na actualidade, praticam este tipo de "luta" voluntarista.
Aliás, penso que estes grupos, ontem como hoje, só servem para dar aos fascistas algumas "justificações" de que eles precisam para aparecer (não para existirem, mas para dizerem "estão a ver como nós somos necessários para travar estes tipos, já que os governos democráticos não o conseguem fazer?").
Ou, como diz Álvaro Cunhal, «numa tal batalha entre dois terrores» neste caso, a acção violenta gratuita de certo tipo de anarquistas ou da "extrema-esquerda" «venceria aquele que dispõe de recursos incomparavelmente superiores», ou seja, a "tropa de choque" do cxapitalismo que são, como se sabe, os fascistas - prontos a avançar em situações de "crise", real ou fabricada, muitas vezes de forma até inconsciente por aqueles que os dizem combetar (e que, sem darem por isso, são manipulados por quem não é nada "revolucionário", muito menos ingénuo - na História há alguns exemplos disto que refiro).
De qualquer forma, e para não me acusarem de «recusar a violência revolucionária» (que eu já sei do que a casa gasta...) agradeço-te o facto de teres referido que o PCP já tinha criado a ARA (Acção Revolucionária Armada) quando Álvaro Cunhal escreveu este artigo.
Portanto, também não é por aí.

António Vitorino

Debaixo do Bulcão disse...

Sobre a actualidade deste texto, tenho a dizer ainda o seguinte:

Eu, que nem tenho vocação nenhuma para teorizar (muito menos para doutrinar), ando tentado a escrever algo sobre determinadas teorias que, quando foram formuladas, tinham aspectos mais propagandísticos que rigorosos (ou "científicos", se preferirem), mas que, com o passar do tempo, se revelaram análises que assentam que nem uma luva na realidade... futura.

É o caso da teoria leninista sobre o imperialismo como fase final do capitalismo.
Não me interessa por ora debater se é ou não a "fase final".
Interessa-me, sim, verificar (porque acho um fenómeno muito curioso) que, com a "globalização" em curso, essa teoria está hoje mais actual do que no tempo em que foi elaborada.

Será que o homem tinha uma máquina do tempo?

Ou será que, afinal, este processo, embora mais evidente agora, é uma história já muito, muito antiga?...

(O mesmo é válido para estes grupos supostamente anti-globalização... e na prática anti luta eficaz contra o imperialismo.)

Vitorino

Debaixo do Bulcão disse...

Ah, Luís Eme, deixa-me lá discordar de ti em mais um ponto. Neste caso é uma coisa só tangencial a este assunto (e ainda bem, para abreviar).
É que, dizes tu, Álvaro Cunhal «nunca gostou muito de fazer publicidade às outras forças politicas».
E eu lembro-me do tempo em que estava para aparecer o PRD (Partido Renovador Democrático - não tem nada a ver com o PNR; isso - a maneira como eles compraram o PRD - é outra história), nesse tempo foi precisamente o Álvaro Cunhal que, nos comícios do PCP, alertava para o surgimento do "partido do ex-Presidente da República" (como também era conhecido - aliás, esteve para se chamar só PR).
Parece-me que fez ele mais publicidade ao PRD que o Ramalho Eanes e os seus correlegionários!...
Refiro isto porque penso que seria interessante para os jovens "radicais de esquerda" da actualidade aprenderem um bocado com as tácticas do PCP de Cunhal (e já agora dos bolcheviques de Lenin...), para ver se se acalmam um bocadinho e pensam naquilo que realmente se estão a meter quando defendem aquelas coisas de que já falei.

Vitorino
(afinal não abreviei assim tanto)

Luis Eme disse...

Há tanto a dizer sobre isso...

Tens razão quando dizes que Álvaro Cunhal sempre foi um defensor da luta pacífica, mas no começo da década de setenta foi mesmo obrigado a "alinhar" na luta armada com a ARA, tantas foram as pressões no interior do partido.